terça-feira, 14 de junho de 2011

38.Verdades miudas de Gregório de Matos

As laranjeiras dão frutas,
Mulheres damas são putas,
Uma talha são dez polhas;
As botijas levam rolhas,
Toda neve é branca e fria,
A irmã da mãe é tia,
E o bronze todo duro,
Onde não há luz é escuro,
Quando não é noite é dia,

A chuva aonde cai molha,
Quem não tem vista não olha,
Ossos na boca são dentes;
É afronta dizer - mentes!
É ave grande a galinha,
O cabelo cai com tinha,
Quem é rouco tem catarro,
Carregado canta o carro,
Mulher de rei é rainha.

Não há barbas sem cabelo;
A areia toda é grãos;
Toca-se a harpa com as mãos;
É animal o camelo;
Nenhuma calva tem pêlo; - ...
É marisco o sururu;
Todo feijão é legume;
Coze-se o comer no lume;
É abóbora o jerimu.

[...]

Todo o chapéu é sombreiro;
As canoas são de pau;
Tudo o que não presta é mau;
Quem faz barbas é barbeiro; - ...
Tem cano a pena de pato;
Filho de pardo é mulato;
Mulheres todas são fêmeas;
Duas de um ventre são gêmeas,
No pé se calça o sapato.

[...]

Chocolate tem cacau,
Passa dez não é pacau,
Clérigos todos os padres;
É cego não ver por grades,
O limão todo é azedo,
O que tem pavor tem medo,
É boa a mulher que bole,
Não é boa a pica mole,
A pedra grande é penedo.

[...]

Estas pois, e outras verdades,
Amigo, que aqui vos digo,
São as de que sou amigo; - ...
O mais são só asnidades
Desses que dizem rodeios;
Porque só por esses meios
Se fala bem português;
Tudo o mais é ser francês,
E trazer na boca freios.


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